Oratório Festivo – imagens soltas e um convite à ternura

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“… puzemos mão, há coisa de 2 annos, á obra de um Oratorio festivo”. Destaque aqui ao Diretor das Oficinas de S. José, Pe. Agostinho Collusi, que nas suas palavras conseguiu “… falar aos corações, mostrando a repellente hediondez da educação de nossos dias, deficientissima e banal, e alevantando o optimo da educação como deve ser”. Linhas convergentes________________________________________________________ Por Frederico Pimenta Releitura dos documentos originais da história dos Salesianos em Portugal. Trabalho ímpar de tantos investigadores, com especial destaque para o Pe. Amador Anjos, historiador, conhecedor profundo e inspirador de dissertações e teses sobre a vida e obra dos Salesianos em Portugal. A envolvente económica e social dos finais do século XIX e princípios do XX despertou os sentimentos de numerosas personalidades que olharam com particular atenção para o problema da juventude vítima dessa estrutura. A resposta a este problema, num olhar próprio de D. Bosco, passou pela criação de espaços e metodologias totalmente diferentes daqueles que abalaram D. Bosco, em que os jovens pudessem encontrar os fundamentos básicos de uma educação digna. Designados Oratórios Festivos, depressa apresentaram resultados positivos no acompanhamento dos jovens mais novos e mais carenciados de Turim e, mais tarde e noutras realidades, em diferentes geografias. O jornal A Voz da Verdade não hesita em escrever que a obra de D. Bosco recebe homenagem de “… adeptos de todas as crenças e livres-pensadores mesmo ilustres”. (1) Postura digna deste sacerdote que rapidamente encontrou seguidores e solicitadores ao acompanhamento por parte do pessoal salesiano disponível para uma futura assistência, encontrando em diversos lugares estruturas semelhantes a estes Oratórios que mais tarde foram dinamizadas e enriquecidas com a presença dos herdeiros de D. Bosco. No Boletim Salesiano, a orientação a aplicar nos Oratórios e as linhas estruturantes desse audacioso projeto, iniciado em 1841, são transmitidas ao longo do tempo e através de descrições de acontecimentos ocorridos. Os principais temas e a importância do assunto derramaram-se no extenso texto, dividido ao longo dos diferentes meses da publicação, com o título “Cinco Lustros do Oratório Salesiano de Turim”, pela escrita do Padre João Bonnetti. A mesma dinâmica foi vivida nas Oficinas de S. José de Lisboa quer na herança de instituições semelhantes quer noutras criadas em redor da obra de Campo de Ourique. Na sequência dos três anos finais da monarquia portuguesa, a saber, 1908, 1909 e 1910, e do início da república, o Boletim Salesiano desses anos apresenta dados sobre a dinâmica envolvente dos Oratórios neste espaço lisboeta das Oficinas de S. José. São breves notas que trazem subjacentes horas e dias de convívio, por vezes numa primeira experiência, de salutares brincadeiras e condutas corretas e honestas. Em 6 de janeiro de 1908, nas instalações das Oficinas de S. José em Lisboa, realizou-se um encontro, “Foi esta propriamente a primeira festa que fez o Oratorio festivo…”, noticiado em maio, com a narração de um momento desse Oratório. (2) O Oratório nascido junto à edificação traçada pelo arquiteto Cerradini, cedo sentiu o desejo de crescer e tecer o manto protetor inerente a estes ambientes. Logo “… puzemos mão, há coisa de 2 annos, á obra de um Oratorio festivo”. Destaque aqui ao Diretor das Oficinas de S. José, Pe. Agostinho Collusi, que nas suas palavras conseguiu “… falar aos corações, mostrando a repellente hediondez da educação de nossos dias, deficientissima e banal, e alevantando o optimo da educação como deve ser”. Nesta festa, aqui recordada neste folhear do precioso documento que é o Boletim Salesiano, foram premiadas com um crucifico e peças de roupa as crianças que pela sua dinâmica se distinguiram nos encontros realizados. (3) Realce para o apontamento acutilante intitulado “Aulas nocturnas”, onde se dá conta de que “Todas as noites, depois de saírem das fabricas, e das oficinas correm ás oficinas de S. José uns 80 rapazes, que por duas horas e meia assistem á aula nocturna, dividida em duas secções …”. (4) Este momento festivo, anteriormente elencado, foi documentado pela imprensa portuguesa e por um jornal alemão que divulgou então a obra realizada pelos Salesianos em Portugal e concretamente em Lisboa. O ambiente vivido nas Oficinas de S. José procurava cuidar daqueles que no interior das paredes desenvolviam as aprendizagens e o trabalho oficinal com vista a um futuro mais tranquilo. No entanto, nem todos têm admissão e “… o Oratório é o único refugio d’um pobre jovem que não pode achar n’outra parte instrucção, nem corecção ”. (5) A preocupação dos primeiros Salesianos, em Lisboa foi abranger o maior número de crianças e, sempre que possível, criar espaços dignos para o seu desenvolvimento. Ou seja, neste final da primeira década do século XX, “Alargar estas paredes para recolher até 400 meninos. Fundar um Oratório festivo para congregar até 1.000”. (6) Num enaltecimento do conceito de Oratório Festivo extraído do jornal Voz da Verdade n.º 22 de 11 de março, O Boletim Salesiano de 1909 (7) apresenta breves indicadores estruturais do denominado Oratório Festivo. “Um dos processos de atracção de que se servia D. Bosco eram os oratórios festivos, reuniões dominicaes, onde os pequenitos se juntavam para brincar e para aprender.” Em paragens geográficas tão diferentes e com níveis de aceitação igualmente divergentes realce para o robustecimento das presenças Salesianas, por vezes tímidas: “… e daqui nasceram escolas d’artes e officios que hoje se encontram em todo o mundo, …” (8) Do jornal O Portugal de 11 de Maio de 1909, sob o título “ Uma festa para os filhos do povo”, (9) destaca-se uma interessante referência que seguidamente enquadramos. Junto ao edifício inaugurado no ano de 1906, nos terrenos adquiridos pela boa vontade do Marquês de Liveri e de Valdausa, crescia, como já vimos, em paralelo com as aulas e oficinas o espaço do Oratório que atraiu imensos jovens. O relato jornalístico dá-nos uma ideia da dinâmica praticada neste Oratório, nomeadamente das atividades: “ De manham e pelo dia adeante entretiveram-se nos jogos e diversões dos demais dias santos, e tiveram a costumada instrucção religiosa ”. A envolvência de beneméritos nesta rede de bem-fazer surge igualmente exaltada pela participação da obra de caridade das Cozinhas Económicas, inauguradas pela duquesa de Palmela. Também, neste Oratório, a duquesa estava presente, “ Essa Senhora de acrysoladas virtudes e inexceditavel caridade…”. Cúmplice era igualmente dos Salesianos no desejo de aumentar “ o que se acha anexo ás Officinas de .S José, para que assim se possa fazer capella, aulas e recreios tudo completamente isolado dos alumnos internos ”. Além das atividades acima elencadas, o Oratório privilegiava os passeios, como é o caso do realizado à Quinta das Laranjeiras, “Na passada quinta-feira da Ascensão…” onde “entretiveram-se por três boas horas em vivos e innocentes folguedos… ”. Termina o jornal referindo as movimentações dos jovens pela cidade e o facto de que “A maior parte não primavam pelas apuro de seus trajes…“, solicitando ainda ajuda para fazer chegar às Oficinas de S. José todo o tipo de roupa. Neste momento narrado, sobressai a presença frequente de “S. Excia. Revma. O Sr. Bispo de Beja, D. Sebastião de Vasconcellos…”. Este nome destaca-se nas crónicas dos Salesianos em Portugal pelo seu empenho, desde 1880, no que respeita à vinda dos Salesianos para o espaço luso, em especial para o chão portuense. Nesta descrição a ele associado, destaca-se igualmente o nome do Pe. José Maria Coelho, personalidade ímpar na história dos Salesianos desde os primeiros momentos da sua permanência até ao acompanhamento e cuidado na manutenção do edifício centenário, após o fluxo republicano e a tímida retoma do projeto, em 1920. Em 25 de agosto de 1909, sob os auspícios do Papa Pio X, com a presença de D. Miguel Rua (10) e publicação no primeiro Boletim Salesiano de 1910 (11), apresentaram-se as conclusões da Reunião dos Diretores Diocesanos que se reuniram “… para tratarem de assumptos relevantes ao bem geral dessa instituição do Ven. D. Bosco”. Muito aplaudida na altura foi a intervenção do Conselheiro Municipal de Turim, Dr. Fino Xavier. (12) Nessa interposição, além dos considerandos apresentados, o Conselheiro teceu um conjunto de propostas para a modernização e dinamização dos Oratórios Festivos. Concomitantemente, a publicação anunciou a criação, em Turim, de uma nova organização: “ Uma nova organização utilitária a caba de ser erguida para os jovens que frequentam esse Oratorio Festivo (…) um Officio-Agencia para o interesse juvenil económico-social…”. Esta organização, composta por seis secções, pretendia responder “… ás múltiplas exigências da vida actual com respeito ao trabalho, á economia e a previdência”. (1) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VIII, Junho, 1909, Vol. III – N. 6. (2) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VII, Maio, 1908, Vol. II – N. 5. (3) “ Prémios! Quereis ver um rosto de creança afogueado pela esperança? Que lhe brinque nos lábios amoroso sorriso? Promettei-lhe, pondo-lhe deante dos olhos o incentivo d’um premio, pequeno que elle seja: tê-la-eis logo mais afeiçoada ao seu dever, mais circumspecta e cautelosa, mais metida em si e mais calada. Nenhum educador o desconhece, nenhuma mãe o ignora. Não o desconheceu D. Bosco.” in Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VII, Junho, 1908, Vol. II – N. 6, Turim. (4) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VII, Maio, 1908, Vol. II – N. 5 (5) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VIII, Abril, 1909, Vol. III – N. 4. (6) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VIII, Junho, 1909, Vol. III – N. 6. (7) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VIII, Junho, 1909, Vol. III – N. 6. (8) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VIII, Junho, 1909, Vol. III – N. 6. (9) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno VIII, Julho, 1909, Vol. III – N. 7. (10) D. Miguel Rua faleceu em Turim, Itália, no dia 6 de abril de 1910. A notícia surge escrita em maio, no Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno IX, Maio, 1910, Vol. III – N. 5 e no número especial de junho/julho que se seguiu, de forma exaustiva e piedosa. Foram celebradas exéquias solenes em Angra do Heroísmo, Braga, Porto, Viana do Castelo e Lisboa. (11) Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno IX, Janeiro, 1910, Vol. III – N. I. (12) Este homem de cultura publicou, além de outros, o livro “Domingos Savio, Alumno do Oratorio Salesiano de Turim”, no ano de 1914.