1913 – Memórias em tempo de suspensão

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Grupo dos novos Missionário Salesianos

No que respeita à Obra Salesiana no mundo, o Pe. Paulo Albera, Reitor Maior dos Salesianos pediu “ó beneméritos Cooperadores, que vos digneis empregar a vossa caridade na consolidação de todas as nossas casas, porque todas necessitam do vosso auxilio”. (2) Apontou, neste ano de 1913, a manutenção e o desenvolvimento dos oratórios festivos, dos hospícios, das escolas profissionais, dos colégios e das missões.

Linhas convergentes

Releitura dos documentos originais da história dos Salesianos em Portugal. Trabalho ímpar de tantos investigadores, com especial destaque para o Pe. Amador Anjos, historiador, conhecedor profundo e inspirador de dissertações e teses sobre a vida e obra dos Salesianos em Portugal.

Por Frederico Pimenta

1913 – Memórias em tempo de suspensão 

Em Portugal, no ano de 1913, Afonso Costa, após as curtas governações de Teófilo Braga, João Chagas, Augusto de Vasconcelos e Duarte Leite no início da implantação do regime republicano, forma governo, pela primeira vez, em 1913. Foram momentos de alguma precariedade, conseguindo o 5.º governo republicano “efectuar algumas reformas importantes (…)”.   (1)

No que respeita à Obra Salesiana no mundo, o Pe. Paulo Albera, Reitor Maior dos Salesianos pediu “ó beneméritos Cooperadores, que vos digneis empregar a vossa caridade na consolidação de todas as nossas casas, porque todas necessitam do vosso auxilio”. (2) Apontou, neste ano de 1913, a manutenção e o desenvolvimento dos oratórios festivos, dos hospícios, das escolas profissionais, dos colégios e das missões. Este ano foi, aliás, marcado de forma indissipável pela viagem que o Pe. Paulo Albera realizou, desde o dia 2 de janeiro desse ano, pelas obras salesianas existente em território espanhol. Circunstância perpetuada nas linhas do Boletim Salesiano. (3)

Na reminiscência dos 25 anos da morte de D. Bosco e no cumprimento da resolução do “1º Congresso internacional de ex-alumnos Salesianos”, mais tarde assumida pela “1ª Assembleia dos ex-alumnos do Piemonte “, iniciou-se a divulgação correspondente à edificação de um monumento a D. Bosco, na cidade de Turim. O concurso internacional foi acolhido por cerca de 200 escultores. (4) A exposição dos trabalhos apresentados teve lugar no teatro do Oratório de Turim com a presença da Princesa Maria Leticia de Saboia, Duquesa de Aosta, outros membros da nobreza e o Pe. Rinaldi. De acordo com os relatos, mais de doze mil pessoas assistiram a esta exposição, que teve ampla cobertura da imprensa. As descrições “do conceito inspirador dos vários artistas que apresentaram seus modelos para o monumento ao Veneravel,” (6)  foram publicadas no Boletim Salesiano ao longo do restante ano, num trabalho documental de diamantífero rigor e interesse.

Estamos, no que a Portugal reverencia, num momento de cessação e dúvida em relação à obra sonhada por D. Bosco e edificada pelos seus seguidores. Nas torrentes de informação provenientes de outros territórios geográficos, nomeadamente da América do Sul, com as robustas descrições etnográficas e culturais, contrapõe-se a ausência, praticamente durante uma década, de referências a Portugal e, em particular, neste ano de 1913. Do quase nulo, ou das ténues aproximações a Portugal, damos notícia neste escrito. No que concerne ao agradecimento de graças recebidas, elas surgem de proveniências diversas no território português de então. No âmbito necrológico, destacam-se personalidades identificadas com o desenvolvimento do espírito salesiano no espaço luso. Destacamos, no conjunto deste ano de 1913, a figura de D. José Alves de Mariz, Prelado de Bragança; José Bento Pereira, benfeitor da Oficina de S. José do Porto; Padre António José de Macedo, Escrivão da Câmara eclesiástica do Funchal;  D. Manuel Baptista da Cunha, Arcebispo de Braga, que “Á Obra de D. Bosco dedicou tambem affecto e desvelos(…)”; (7) Dr. António de Sousa Silva Costa Lobo, benfeitor das Obras de D. Bosco; Marquês da Praia e de Monforte, oficial mor da casa real e benfeitor; D. Filomena Benedicta de Souza Cruz Vieira, benemérita Cooperadora; D. Claudina Chamiço, Cooperadora Salesiana e benemérita e D. Maria José d’Oliveira Martins, Cooperadora Salesiana.

Redigida em Macau e publicada no Boletim Salesiano, (8) deu-se conhecimento, pelo punho do Pe. Luís Versiglia, de uma jornada por terras chinesas, centrando atenção na povoação de Seong-Chau, e da total disponibilidade do Pe. Luís para conhecimento dessa zona: “Recebi aviso de um christão e parti imediatamente”. (9) Documento interessantíssimo sobre os primeiros anos do século XX, a descrição de curiosidades, factos de pirataria, o ambiente revolucionário e a perspetiva do trabalho missionário que se vivia na China.  Ao longo deste ano de 1913, outras notícias chegaram deste território oriental, redigidas desde Macau, com testemunhos desse ambiente.

Proveniente do Trieste, Itália, veio a notícia publicada no Boletim Salesiano, sob o título geral “Entre os filhos do povo”, à realização de “uma diversão”, (10) no Oratório Salesiano da cidade, aos recéns ordenados missionários (documento fotográfico incluso no topo do artigo) Desse grupo, quatro, de diferentes nacionalidades, partiriam para a Índia e a China, no dia 4 de novembro de 1912, e, entre eles, o Pe. José da Silva Lucas, que deixou Portugal após a proclamação da república e, em Itália, concluiu os estudos e foi ordenado sacerdote. Foi aluno do Colégio de S. Caetano de Braga e estudou teologia nas Oficinas de S. José, em Lisboa. O seu trabalho desenvolveu-se em Macau, concretamente no Orfanato da Imaculada Conceição a que já aludimos em textos anteriores, e, após uma permanência de 15 anos, regressou a Portugal, onde exerceu diferentes funções nas casas salesianas, tendo falecido em 1951.

Notícia com dicção portuguesa proveniente da Califórnia, concretamente de Oakland e na presença salesiana naquele local, refere-nos a dificuldade sentida pela comunidade portuguesa daquele território e a disponibilidade da presença salesiana na paróquia respetiva. Os salesianos disponibilizaram gratuitamente instalações para a implementação de aulas de português na igreja portuguesa de S. José, “que bem mostra quanto os Salesianos d’alli se interessam pela instrucção, franqueiando para uma escola a sua casa (…)”. (11) Este facto, transcrito para o Boletim Salesiano, foi publicado inicialmente no jornal União Portuguesas. Proveniente da mesma paróquia portuguesa de Oakland, em carta dirigida ao redator do Boletim Salesiano, datada de 26 de maio de 1913, (12) pelo Pe. Henrique José Ferreira apresenta com um vasto e completo elenco as Festas do Espírito Santo dos Açores: “ahi vae uma relação circumstanciada das festas ao divino Espirito Santo que este anno se realizaram nesta Parochia Portugueza com grande pompa e luzimento”, afirmando que o faz “socorrendo-me para isso da História de Portugal, fundando-me sobretudo no Archivo dos Açores e na tradição”. (13) Este sacerdote foi aluno do Colégio de S. Caetano, em Braga, no momento de entrada dos Salesianos naquela instituição em 1894 e, após a sua ordenação, tendo passado pelas Oficinas de S. José, em Lisboa, a seguir por Turim e tendo ainda assumido a responsabilidade da redação do Boletim Salesiano, foi para a Califórnia. O texto apresentado descreve as movimentações do dia da festa, referindo que “Ninguem deve passar fome ou necessidade nesse dia em que o divino só quer ver alegrias”. (14) Relativamente ao que à História de Portugal concerne, enumera a relação entre esta festa e as fomes, guerras e fenómenos naturais, percorrendo os sucessivos séculos e acontecimentos, fazendo ainda apelo a personagens, como, por exemplo, a Rainha Santa Isabel. Elenco exaustivo e apelativo deste momento que “Ha mais de 400 annos que teem merecido sempre a extrema afeição e amor dos açorianos (…)”. (15)

Por último, neste deambular pelo ano de 1913, tendo subjacente o Boletim Salesiano, referência ainda para duas cartas provenientes da Índia, de duas regiões com ligação a Portugal, dando nota das celebrações de S. Francisco de Sales e de S. José, respetivamente em Tanjor e Meliapor. Descrevem ainda estas duas Casas Salesianas em que apesar da contínua falta de pessoal para assegurar as obras em desenvolvimento, se procura dar resposta ao pedido do Reitor Maior para este ano de 1913. (16)


  1. Garcia, José Manuel, História de Portugal – uma visão global, Editoria Presença. Lisboa, 1981.
  2. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 1, Janeiro, 1913.
  3.  Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 7, Julho, 1913.
  4.  Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 4, Abril, 1913.
  5. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 6, Junho, 1913.
  6. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 6, Junho, 1913.
  7. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 6, Junho, 1913.
  8. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 3, Março, 1913.
  9. Ibidem.
  10. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 3, Março, 1913.
  11. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 6, Junho, 1913.
  12. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 8, Agosto, 1913.
  13. Ibidem.
  14. Ibid.
  15. Ibid.
  16. Boletim Salesiano, revista das Obras de Dom Bosco, Anno XII, Vol. V – N.º 12, Dezembro, 1913.