Linhas convergentes
Por Frederico Pimenta
Releitura dos documentos originais da história dos Salesianos em Portugal. Trabalho ímpar de tantos investigadores, com especial destaque para o Pe. Amador Anjos, historiador, conhecedor profundo e inspirador de dissertações e teses sobre a vida e obra dos Salesianos em Portugal.
1955 / 1956 – o crescimento das OSJ – um apontamento
Com inúmeras dificuldades, as Oficinas de S. José foram crescendo, no lugar dos Prazeres, e as edificações que foram surgindo, desde 1906, cimentaram o grande projeto de formar corretamente os jovens rapazes necessitados da Lisboa e do Portugal de então. Na fotografia que testemunha essa presença e que enquadramos cronologicamente neste escrito, além dos jovens alunos do ano de 1953, visualizamos a presença do Pe. Agenor Vieira, Pe. Renato Ziggiotti e Pe. Armando Monteiro, respetivamente Provincial português, Reitor-Mor dos Salesianos e Diretor das Oficinas de S. José.
Tais projetos, pela sua dimensão, tornavam-se pouco exequíveis, principalmente em virtude do escasseio de verbas para a sua realização, sendo necessário recorrer a apoios e solicitações para o desenvolvimento da assistência aos rapazes. Não é de excluir igualmente a falta de pessoal salesiano que pudesse assegurar um percurso educativo consentâneo.
De acordo com o pensamento do Pe. Amador Anjos, “A partir dos anos 50 foram feitas experiências no sentido de pôr em andamento alguns centros juvenis autónomos e em áreas geográficas próprias, os quais porém tiveram em geral pouca duração”. (1)
Cronologicamente, os testemunhos agora apresentados têm o mesmo tempo, no entanto, testemunham a outra realidade desenvolvida pelos Salesianos no fértil terreno da educação e testemunham o seu protagonismo excelso nesta área.
Os documentos que aqui serão analisados (2) trazem-nos a realidade existente e o futuro sonhado da “(…) obra Salesiana, cuja finalidade principal é socorrer, educar os jovens órfãos, pobres e desvalidos e preparar-lhes um futuro digno na Sociedade”. (3)
Em primeiro lugar, na carta datada de março de 1955, renova-se a característica fundamental da Obra Salesiana e a sua dependência de auxílios externos, nomeadamente das instituições estatais. Faz-se referência aos benfeitores que tanto ajudaram a Obra Salesiana, “um apoio sem o qual não poderíamos viver”. (4)
Demonstrando que o apoio deslocado para a instituição, pelo Estado, se revela diminuto face aos números das crianças apoiadas, indica-se a realidade dos alunos que frequentam as instalações das Oficinas de S. José. Sabemos, desta forma, da existência de 163 alunos internos; 315 alunos na instrução primária; 98 no curso comercial e ciclo preparatório; 146 órfãos; 430 rapazes de assistência e educação com frequência aos domingos e 315 rapazes alimentados. Os números são reveladores da necessidade de ajuda e facilmente se reconhecerá o pedido de apoio mais concordante com a realidade.
Em segundo lugar, um ano após as formulações apresentadas no parágrafo anterior, surge um novo anseio em forma de edifício alçado, mas tendo sempre, no horizonte educativo, o auxílio aos rapazes necessitados. O documento datado de 24 de julho de 1956 apresenta e suporta esta ideia e transporta-nos para a situação de um tempo de mudança gerador de estruturas adequadas às necessidades dos planos educativos nacionais, remetendo-nos para o pensamento do Pe. Pedro Rota. “A introdução do ensino liceal, embora limitado ao externato, veio responder em parte ao alvitre do visitador extraordinário Pedro Rota, no recuado ano de 1928, no sentido de uma abertura a este nível de ensino”. (5) Revelou-se assim completamente contrário ao pensamento primigénio da Obra Salesiana em Portugal. Contraste com a posição, herdada do Pe. Pedro Cogliolo de não aceitar colégios, mas sim instituições dedicadas ao ensino das artes.
Estamos perante a nova mentalidade da década de 1950 orientada para novas construções fruto das modificações na estrutura do ensino.
As Escolas Profissionais Salesianas – Tipografia, Encadernação, Marcenaria, Talha, Alfaiataria, Curso Industrial, Comercial e Instrução Primária – comportavam, em Lisboa, no período coevo às cartas aqui apresentadas, o número diário de 580 alunos em regime de internato, semi-internato e externato, excluindo os que frequentavam o Oratório Festivo. O número de pedidos não atendidos, tendo como fim a frequência nas Oficinas de S. José de Lisboa, ultrapassava os 1500 jovens. Tal facto advém da impossibilidade existente a diferentes níveis de resposta às situações que foram surgindo.
O projeto aduzido, que visava mitigar as carências, comportava a edificação de um externato com ocupação prevista de 900 a 1000 rapazes necessitados, sem esquecer as zonas carenciadas da Fonte Santa, Casal Ventoso, Maria Pia e Alcântara. O número total seria de 1500 jovens.
O sonho transformado projeto com a execução prevista de 4 anos aumentaria o número de apoios possíveis a rapazes em regime de internato (400 alunos), pavilhão de artes gráficas, secção de antigos alunos, ginásio e capela.
Como sonho salesiano, não foi esquecida a vertente lúdica e artística, com espaço, em concreto uma sala, para a arte cénica.
Este pequeno aceno escrito, aqui relido, testemunha o permanente cuidado da Obra Salesiana, o seu envolvimento com a sociedade, no geral, e a benemerência de outras instituições, inúmeros particulares e o próprio Estado, que tornaram possível, desde a embrionária data de 1894, o grande desiderato salesiano.
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- Anjos, Amador, Centenário da obra salesiana em Portugal – 1894-1994 – ao serviço da juventude e do povo, Província portuguesa da sociedade salesiana, Lisboa, 1995, p. 75.
- Carta do diretor das OSJ ao Subsecretário de Estado da Assistência e carta do diretor das OSJ ao ministro das Obras Públicas, respetivamente em 1955 e 1956.
- Carta do diretor das OSJ ao ministro das Obras Públicas, em 24 de julho de 1956.
- Carta do diretor das OSJ ao Subsecretário de Estado da Assistência, em março de 1955.
- Anjos, Amador, Oficinas de S. José – os Salesianos em Lisboa, Lisboa, 1999, p. 230.