… Ainda! Porque a escola ainda (!) não gosta das crianças!
As crianças trabalham das 8 às 8.
Muitas delas passam até 55 horas por semana na escola.
Têm tempo demais de atividades extracurriculares.
Têm recreios de menos.
Ainda são, muitas vezes, castigadas ficando sem recreio, dias a fio. Ou, de castigo, são obrigadas a ir para a biblioteca (não constando que essa medida tenha o patrocínio do plano nacional de leitura).
Não brincam 2 horas todos os dias como deviam.
Vivem num stress permanente – por causa do estilo de vida que têm e das exigências que colocamos sobre elas – que não é amigo nem da atenção nem da aprendizagem.
São divididas por turmas de forma pouco aleatória, por vezes, batoteira, e em vez da escola ser inclusiva, como devia, vivem em turmas que separam “os bons” dos “maus”, dando a uns e a outros colegas e professores distintos.
Vivem as diversas disciplinas como se umas fossem “de primeira” e outras “de segunda”. De acordo, aliás, com o que escutam na escola e com os pais.
Ninguém lhes diz que enquanto não descobrirem as suas próprias necessidades educativas especiais lhes faltará quase tudo para descobrirem aquilo que sabem.
Têm explicações e ateliers de tempos livres demais e família e mundo de menos.
Vivem espartilhadas em quadros de honra e quadros de excelência demais e por rankings que, orgulhando-se pelo rigor numérico que exibem, são, muitas vezes, formas desonestas e falsificadas de publicidade enganosa.
Não são tão ajudadas a descobrir, a estudar, a comunicar e a criar como deviam. Antes são, ainda, incentivadas a repetir e a copiar. E a entrar, demais, numa resignação do tipo “marra, vomita e esquece”.
Ainda são castigadas por serem “cabeças no ar” e raramente há quem se alarme que elas aprendam “de olhos no chão”.
Aprendem a olhar para as costas umas das outras ou olhando-se pelo canto do olho como se se distraíssem sempre que aprendem a olharem-se nos olhos umas das outras.
Vivem, regra geral, numa lufa-lufa escola/trabalho trabalho/escola sem se dividirem por outros compromissos – familiares, sociais, lúdicos, cívicos e etc. – como se a vida não nos obrigasse a repartir por muitos desafios, ao mesmo tempo, que se aprendem a gerir por ensaio e erro.
Habitualmente, o tempo que dispendem com a escola não corresponde aquilo que, intuitivamente, sentimos que elas deviam saber.
São convidadas a escolher aos 14 uma área de estudo e uma profissão onde sejam, garantidamente, felizes nos próximos 55 anos. E, de preferência, independentemente da sua singularidade, do seu mundo, da sua educação e do seu carácter – ganhem muito dinheiro muito depressa.
E, no entanto, as crianças gostam de ir para a escola. Mais por causa dos recreios e dos amigos que das aulas, é certo.
É estranho precisarmos de falar duma escola amiga das crianças. Porque escola que é escola não devia ser outra coisa senão amiga para as crianças.
Talvez as crianças não gostem da escola porque a escola (ainda!) não gosta das crianças.
Eduardo Sá