José Neves
Em 1925, apoiado pela Grã-Bretanha, Mohammed Pahlavi inaugurou no Irão uma nova dinastia, que iria ao encontro dos interesses ocidentais, que viam no petróleo iraniano uma mais-valia essencial ao seu próprio sucesso económico. Até à Revolução Iraniana, de 1979, os dois Xás do Irão, pai e filho, mantêm um regime laico, politicamente opressivo e economicamente desigual, embora este seja amplamente considerado um período de forte modernização do país, adotando os valores sociais dos seus aliados ocidentais. Neste sentido, os direitos das mulheres, em particular, serão, durante este período, alargados, sendo estas encorajadas a vestir-se de forma «americanizada», a estudar e possibilitadas de votar.
Na imagem observa-se um arco, de um estilo marcadamente árabe, mas também, num segundo plano, um cinema, anunciado na grafia ocidental, o que revela uma aproximação a este «outro mundo», uma interseção entre duas culturas distintas.
O cinema foi, desde cedo, identificado como uma ferramenta útil à promoção de uma sociedade ocidentalizada, substituindo subtilmente as perspetivas que antes haviam sido aplicadas, conferindo legitimidade e um apoio coeso às novas normas. Num primeiro estágio, as técnicas de propaganda empregues pelo Estado são rudimentares: é tocado o hino nacional ou mostrado um vídeo ilustrativo das conquistas do regime antes de cada sessão de cinema. Já nos anos cinquenta, após os países ocidentais afastarem um governo hostil aos seus interesses, reforçando o poder daqueles que lhe eram leais na estrutura política iraniana, com a ascensão do novo Xá, é compreendido todo o potencial deste meio. As produções americanas, de Hollywood, multiplicam-se nos cinemas iranianos (sempre dobradas para serem entendidas por toda a população) e os próprios filmes iranianos, que adquirem simultaneamente um traço artístico distintivo da própria cultura e a influência das correntes americanas, ilustram também alguns dos «vícios das sociedades capitalistas» (como via a oposição) vestidas no seu tom característico, que eram assimilados pelo público, ainda que de forma inconsciente, num contexto de consumismo, em cenas de dança, música (pop), fumar, beber e sexualmente explícitas, sem esquecer nunca o processo de modernização que o Irão experienciava, evidenciando-o.
Não é, por isso, surpreendente que, numa sociedade do Médio Oriente, como relembra a imagem, onde existia ainda uma vasta população conservadora e protetora das suas tradições, um dos gatilhos da Revolução fosse o ataque ao Cinema Rex, em 1978, no qual centenas de civis perderam as suas vidas, prevendo assim a queda do Xá.
José Neves | 11.º E4