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Num mundo desses, a última coisa de que um professor precisa é dar aos seus alunos mais informação. Eles já têm informação a mais. Em vez disso, as pessoas precisam é da capacidade de discernir a informação, de perceber a diferença entre o que é importante e o que é irrelevante, e, acima de tudo, de combinar os vários pedaços de informação para obter um retrato completo do mundo.
Na verdade, há séculos que este tem sido o ideal do sistema educativo liberal do Ocidente, mas até agora muitas escolas ocidentais têm ficado muito aquém de o cumprir. Os professores permitiam a si mesmos concentrar-se no decorar de dados, ao mesmo tempo que encorajavam os alunos a «pensar por si próprios». Devido ao seu medo do autoritarismo, as escolas liberais tinham um horror particular a narrativas grandiosas. Partiam do princípio de que, se dessem aos alunos muita informação e alguma liberdade, estes iriam criar a sua própria imagem do mundo, e mesmo que esta geração não o fizesse, haveria muito tempo para construir uma boa síntese no futuro.
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Assim, o que devemos ensinar? Muitos especialistas em pedagogia defendem que as escolas devem mudar de modelo e passar a ensinar os «quatro C»: pensamento crítico, comunicação, colaboração e criatividade. De uma perspetiva mais ampla, as escolas devem dar menos atenção às aptidões técnicas e colocar a ênfase nas aptidões de vida polivalentes. Acima de tudo, estará a capacidade de lidar com a mudança, de aprender coisas novas e de preservar o equilíbrio mental em situações novas. Para conseguirmos acompanhar o ritmo do mundo em 2050, será preciso não só inventarmos novas ideias e novos produtos, mas sobretudo reinventarrno-nos a nós mesmos uma e outra vez.
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Em meados do século XXI, a mudança cada vez mais acelerada, somada a esperanças médias de vida mais longas, tornarão este modelo tradicional obsoleto. A vida irá romper pelas costuras e haverá menos continuidade entre os diferentes períodos da vida. «Quem sou eu?» será uma pergunta ainda mais urgente e complicada do que algum dia foi.
É provável que isto implique níveis de stress imensos. Porque a mudança é sempre stressante e, após uma certa idade, a maioria das pessoas não gosta de mudar. Quando se tem 15 anos, toda a nossa vida é mudança. O nosso corpo cresce, a nossa mente desenvolve-se, as nossas relações aprofundam-se. Tudo flui e tudo é novo. Estamos ocupados a inventar-nos. Para a maioria dos adolescentes, isto é assustador, mas, ao mesmo tempo, também é empolgante. Novos horizontes abrem-se diante de nós e temos o mundo inteiro para conquistar.
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No passado, era uma aposta relativamente segura seguir o que diziam os adultos, pois eles conheciam muito bem o mundo, e este mudava devagar. Mas o século XXI vai ser diferente. Devido ao ritmo cada vez mais acelerado da mudança, nunca poderemos ter bem a certeza se os adultos nos estão a transmitir sabedoria intemporal ou algum dado tendencioso e já ultrapassado.
Então, para quem nos devemos voltar? Para a tecnologia, talvez? Essa é uma jogada ainda mais arriscada. A tecnologia pode ajudar-nos muito, mas, se ela tiver demasiada influência nas nossas vidas, podemos ficar reféns das suas intenções. Há milhares de anos, os seres humanos inventaram a agricultura, mas esta tecnologia enriqueceu apenas uma elite minúscula, escravizando a maioria das pessoas. A maioria delas deu por si a trabalhar de sol a sol, arrancando ervas daninhas, transportando baldes de água e apanhando milho sob um sol escaldante. Isso também lhe pode acontecer a si.
A tecnologia não é uma coisa má. Se soubermos o que queremos fazer com as nossas vidas, a tecnologia pode ajudar-nos a alcançá-lo. Mas se não soubermos o que queremos da vida, é muito fácil a tecnologia condicionar os nossos objetivos e controlar a nossa vida. Especialmente à medida que a tecnologia for compreendendo melhor os seres humanos, podemos dar por nós a servir os seus interesses, em vez de ser ela a servir os nossos.
Já viu aqueles zombies que andam pelas ruas com as caras coladas aos smartphones?
Acha que eles controlam a tecnologia ou que é a tecnologia que os controla a eles?
Harari, Yuval (2018) | 21 Lições para o Século XXI. Lisboa: Elsinore