Lembro-me de quando, há dois anos, assisti à Conversa de Porta-Aberta da Marta, uma alegre dramaturga estreante, que, numa hora e pouco, não só demonstrou que o teatro era um mundo muito mais vasto do que eu alguma vez pensara, como conseguiu a proeza que mil cartazes, anúncios saltitantes e diversas incitações bem-intencionadas de uma avó ou de uma professora nunca haviam alcançado – convencer-me a ir ver uma peça por iniciativa própria.
Lá fui, acompanhado de uma colega igualmente movida por aquele testemunho entusiástico, e, pondo em curtas palavras as distâncias a que nos transporta uma inesperada experiência, renovadora, aberta, incessante: amei. Desde então, olho o teatro com outros olhos. As peças a que fui entretanto assistir, todas me souberam a pouco – como quem diz, a muito (já o cantava Sérgio Godinho – “Hoje soube-me a tanto, portanto / Hoje soube-me a pouco”). O momento em que a luz desfalece calmamente, até se atingir a escuridão que as personagens, a ação, os tons e vozes, o sentimento, vêm depois quebrar, é das memórias mais felizes que retenho – a ela me remeto em tempos de expectativa, para me ajudar a compreender o que ainda está por acontecer e como tudo é um espetáculo para o qual nos devemos preparar com um sorriso interessado. Quando o ato final se esgota, e tudo o que eu então não sabia, ou não queria acreditar, se consolida, a sensação é parecida – acabou, no entanto, sinto que um vazio se abre depois de cada fala terminal, à espera de uma outra conclusão, que só eu lhe posso dar, segundo os meus sonhos e conclusões – e cada espectador ao meu lado, segundo as suas.
E a razão pela qual partilho estas experiências – num registo aproximado ao que eu próprio tentei fazer na minha própria Conversa de Porta-Aberta – prende-se precisamente com a afortunada nomenclatura deste tipo de apresentações promovidas por Literatura Portuguesa. Além de momentos em que se apresentam perspetivas e histórias que parecem, talvez por ignorância, talvez por cânone social, incomuns, e mais que oportunidades de explorar realidades para lá da realidade, germinando fora desta caixa tão quadrada que é o mundo, as Conversas são um exercício de revelação – no fundo, o que a Marta fez foi, com o seu discurso, escancarar uma gigantesca porta que eu nem sabia que ali estava. Ao convidar-me a trespassar o seu arco, a Marta não só me introduziu ao teatro e às suas maravilhas, como me proporcionou sentir o que acima descrevi e ainda provou que, uma vez aberta, uma porta dá acesso a muito mais do que que aparentemente velava. Podemos retornar e, voluntariamente, abandonar a divisão, ou mesmo fechar a porta atrás de nós; não podemos, porém, apagar o que aprendemos e, ao passar junto dela, ser-nos-á impossível não pensar nos mundos que suspiram do lado de lá, bem perto do nosso alcance. Como a Marta me abriu a sua porta, espero ter conseguido fazer jus à causa e abrir também uma outra – a da escrita criativa, através de uma fresta luminosa chamada Poesia.
Findo, então, com um pedido àqueles que procurei atrair à exploração do que, para lá dessa fresta, freme pulsando, à espera de ser desvendado: por favor, mantenham a porta aberta – nunca se sabe quando renasce a vontade de a atravessar, e assim será mais fácil.
João Martins – antigo aluno dos Salesianos de Lisboa
O abrir de uma… aliás, de várias portas
Uma porta de passagem
Que o João abriu
Para nos transmitir uma mensagem
para o belo mundo
da escrita criativa
que tanto nos cativa
e mantém a alma viva.
Falámos de palavras
E, com versos,
Aprendemos que poesia está um pouco em tudo, podendo relacionar-se com quadros.
Ou até com a vida em si.
“Depois das palavras, só te tenho a ti.”
Tudo começou com a oferta de um caderno
Um de muitos,
Com pensamentos eternos.
Tudo começou com uma conversa
De porta aberta
Que porta é essa?
Não sei,
Não a sei descrever.
Mas depois de a atravessar
Não consigo não escrever.
Se bem que às vezes
Falta-nos o tempo
Para semear e deixar crescer o rebento
“Silêncio! Não consigo ouvir o vento.”
Turma de Literatura Portuguesa | 11.ºH1