Frederico Pimenta “Dois pequenos da Escola de Santa Clara junto do túmulo de D. Brites Pereira e das Relíquias do Santo Condestável.” “Em Lisboa, nas Oficinas de S. José, “Num ambiente de fervor patriótico a assistência aplaudiu os vários números dum programa bem ordenado e primorosamente executado em honra do Herói que glorificou a Pátria e que, esperamos, a Igreja há-de glorificar”. Augurava-se, então, a futura data de 26 de abril de 2009 quando o Papa Bento XVI canonizou D. Nuno Álvares Pereira. Estes momentos condestabrianos foram destacados no Boletim Salesiano de Maio e Agosto/Setembro de 1961.” Linhas convergentes ________________________________________________________ Por Frederico Pimenta Releitura dos documentos originais da história dos Salesianos em Portugal. Trabalho ímpar de tantos investigadores, com especial destaque para o Pe. Amador Anjos, historiador, conhecedor profundo e inspirador de dissertações e teses sobre a vida e obra dos Salesianos em Portugal. 1960 e 1961, Anos de celebrações – subsídios para o estudo dos anos destacados inclusos no Boletim Salesiano coevo Nos anos de 1960 e 1961 registaram-se no Boletim Salesiano acontecimentos que, como habitualmente, envolveram as sociedades salesiana e portuguesa de então. A nível da Obra Salesiana, o Pe. Renato Ziggiotti, Reitor Maior (1) no período de tempo evocado, aduziu as seguintes “Estreias” ou, como atualmente se designam, os “Lemas”: 1960 – “Salvemos a moralidade” 1961 – “I Rogar pelo feliz êxito do Concílio Ecuménico, rezando a belíssima oração, que publicamos àparte. II Trabalhar nas nossas famílias, nas Paróquias e nas Associações a que pertencemos, a fim de que se cultive sèriamente a união e a paz desejadas pelo Papa e invocada nas Ladainhas dos Santos com a oração “ut cuncto populo crhristiano pacem et unitatem largiri digneris, Te rogamus, audi nos”. Centralizando-nos nestes acontecimentos, impõe-se recordar e contextualizar o ambiente transformador da sociedade portuguesa, iniciado em 28 de maio de 1926, e toda a evolução desencadeada pelo golpe militar que traria ao poder o Estado Novo e toda a influência que exerceu nos anos subsequentes. Momentos históricos que nos falam de outras posturas perante a sociedade que importa conhecer e refletir. Neste quadro, respigam-se, neste particular, acontecimentos que tiveram igualmente eco nas páginas do Boletim Salesiano e, em concomitante repercussão, na sociedade portuguesa. No ano de 1960, destaque obrigatório para as Comemorações do Centenário Salesiano em Fátima (tema abordado em artigo anterior) e o Congresso Nacional dos Cooperadores com a presença de D. Guido Barra, na sua visita extraordinária à Inspetoria Portuguesa. (2) Abordarei, nesta sequência, num primeiro momento desta vivência interna refletida no Boletim Salesiano, os artigos agregados no número 1 e, num segundo momento, os artigos agregados em 2: 1 – “Centenário da Sociedade Salesiana” e os “20 anos da benemérita actividade das Filhas de Maria Auxiliadora em Portugal” 2 – “V centenário do Infante de Sagres” e “O VI centenário do Santo Condestável”. Primeiro momento A Sociedade Salesiana nasceu em 1859 com a presença de 17 membros que fidelizaram os seus caminhos de futuro, cimentados nas Regras apresentadas ao Papa Pio IX. 1960 laureou o centenário deste acontecimento e na sua comemoração, o Boletim Salesiano elencou “(…) hoje aos olhos do mundo, a um século da sua fundação, um quadro vasto como o próprio mundo”. (3) Apresenta-se a redação inicial da ata de constituição da Sociedade e o elenco da primeira administração. Seguem-se, nesta evocação, os desenvolvimentos obtidos e os números quer da Sociedade Salesiana (20.000 membros) e do Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora (19.540 membros) no ano de 1960 e presentes em 71 países. “Os 20 anos de benemérita actividade das Filhas de Maria Auxiliadora em Portugal” (4), natural apêndice do artigo antecedente, mostrou o desenvolvimento histórico da Pia União de Filhas da Imaculada e o sobrevir de Maria Domingas Mazzarello. Em 1960 celebraram-se os 20 anos da chegada das Filhas de Maria Auxiliadora a Portugal, na cidade alentejana de Évora. Com estruturante cronologia, o Boletim Salesiano fornece as datas da fundação das casas existentes, em Portugal, à data da publicação: 1940, em Évora; 1947, em Setúbal e Freixedas; Golegã (Centro e Hospital) e Porto, em 1951; Aguda e Namaacha, em 1952; Monte-Estoril (noviciado), em 1953; Monte-Estoril (aspirantado), em 1956; Lisboa, Cascais e Barreiro, em 1958; Pinhel e Viana do Castelo, em 1959. Esta estatística é completada com os dados do Apostolado e do número de educandas. Segundo momento A nível nacional, as comemorações henriquinas abrangeram ambientes de índole mais cultural e outras de grande impacto visual como desfiles, cerimónias de condecorações a elementos militares e civis, foi instituída a Ordem Honorífica do Infante D. Henrique e elementos monumentais exacerbados com contextualização no período político então vivido. Destaque, neste último item, para a inauguração do novo e robusto Padrão dos Descobrimentos no local onde hoje se encontra e assiste na mudez do material lítico, à polémica sobre a sua existência. O atual monumento surge no ano de 1960 e considera-se herdeiro do efémero monumento que em 1940 surgiu na Exposição do Mundo Português e extravasado dos projetos de uma figura monumental a construir em Sagres, o que não se concretizou. (5) Nesse momento, além das numerosas realizações, destacou-se a presença dos notáveis membros do Brasil na figura do Chefe do Estado Juscelino Kubitschek de Oliveira. No âmbito das comemorações do V centenário da morte do Infante D. Henrique, marcado desde início do ano pela envolvência da Sociedade Salesiana realça-se, no Boletim Salesiano, a vertente da missionação, “é por isso que o número mais belo, e mais significativo de todas as comemorações seria o envio de numerosas expedições missionárias (…) e o despertar de muitas e sólidas vocações missionárias nas nossas famílias.” (6) No Boletim Salesiano do mês seguinte, esta memória foi retomada: “Todos os portugueses estão a exaltar a memória do Infante D. Henrique, em comemorações que acordam a alma lusíada para a sua vocação histórica.” (7) Continua assim, recorrendo inclusive a breve pensamento do historiador João de Barros, a destacar o papel das vocações orientadas para a ação missionária através da utilização de dois exclamativos, inseridos no título: “Vocações! Vocações!” A figura do Infante D. Henrique e a sua obra foram assim alçados, em sucessão às cerimónias oficiais, nas páginas da presença salesiana: “(…) não podemos esquecer nunca que foi a Fé e o heroísmo do Infante D. Henrique e dos navegadores e missionários da sua geração que a construíram.” (8) No último destaque, em âmbito oficial, as comemorações do nascimento do Santo Condestável, transparecerem na própria Assembleia Nacional onde os deputados linguarejaram robustas considerações: “Leu-se o expediente. O Sr. Deputado Aires Martins traçou o perfil de D. Nuno Alvares Pereira, a propósito da peregrinarão das suas relíquias por terras de Portugal. No mesmo sentido, o Sr. Deputado Franco Falcão destacou especialmente o brilho das comemorações efectuadas em Cernache do Bonjardim. (…) povo, que tanto o amava e tanto lhe devia, elevou-o logo às culminâncias da santidade quando ao chorar a perda do seu mais desvelado protector exclamava: «Morreu o santo, morreu o nosso santo». A dívida nacional para com o santo condestável só será condignamente saldada quando nesta majestosa cidade de Lisboa, que teve a graça de o ver morrer santamente em seus braços, se erguer uma estátua evocativa da figura do herói… Vozes: – Muito bem, muito bem! Orador: – … e se proceder à restauração do Convento do Carmo, em respeito à memória do Santo. Vozes: – Muito bem! O Orador (Franco Falcão): – O Convento do Carmo, restituído ao seu antigo esplendor, seria o mais expressivo santuário da Pátria e da Igreja, donde irradiaria a luz resplandecente da canonização, e o caminho que, através da oração e da penitência, conduziria à consagração das virtudes do beato Nuno de Santa Maria e à sua veneração nos altares do Mundo inteiro. A Nação Portuguesa, que tanto amou e à qual garantiu a suprema condição de povo livre, não pode esquecer toda a gratidão e todas as homenagens que são justamente devidas a D. Nuno Álvares Pereira, esse destemido e corajoso defensor da independência, que é honra e glória de Portugal. Tenho dito” (9) Nas Oficinas de S. José de Lisboa, no dia 25 de março de 1961, sendo diretor o Pe. Lino Ferreira, realizou-se uma sessão com a dupla finalidade de homenagear o Sto. Condestável e a Associação Auxiliadora das Oficinas de S. José, denotando uma vez mais o sinal de agradecimento pelo apoio dado pelos benemerentes à obra salesiana. (10) Ainda na presença de Lisboa, a parte cultural deste momento contou com a declamação de poemas de Ramiro Guedes Correia de Campos (11) e o Auto do Condestabre da autoria de Beatriz Viveiros Pereira, cooperadora salesiana. Em Lisboa, nas Oficinas de S. José, “Num ambiente de fervor patriótico a assistência aplaudiu os vários números dum programa bem ordenado e primorosamente executado em honra do Herói que glorificou a Pátria e que, esperamos, a Igreja há-de glorificar” (12) Augurava-se, então, a futura data de 26 de abril de 2009 quando o Papa Bento XVI canonizou D. Nuno Álvares Pereira. Estes momentos condestabrianos foram destacados no Boletim Salesiano de Maio e Agosto/Setembro de 1961. Anteriormente à data de 25 de março de 1961, em Vila do Conde (13), nos dias 13 e 14 de março de 1961, na Escola de Santa Clara, as comemorações foram igualmente sentidas pelo motivo da presença das relíquias peregrinas de D. Nuno Álvares Pereira serem colocadas junto do túmulo de D. Brites Pereira, filha do Santo Condestável. Os alunos de Vila do Conde, além de inúmeras outras pessoas e instituições, tomaram parte ativa nesta celebração nacional ao Condestável. Aos alunos salesianos, couberam os diferentes momentos musicais das cerimónias e a guarda de honra, mantida por 24 horas, na igreja do mosteiro de Santa Clara. (14) No Boletim Salesiano (15) transcreveram-se ainda ideias avulsas sobre o documento emitido pelo Episcopado Português, no dia 24 de junho de 1960 motivado pelas celebrações. Nelas sobressaíram as determinações “(…) que em harmonia com as disposições dos Ordinários respectivos, haja concentrações de crianças, para louvor a Deus na glória do Beato Nuno, e pedir, pela oração, que Deus se digne apressar a hora da canonização e que em todas as terras de maior importância se realizem sessões, nas quais se estude a figura heroica de guerreiro e monge.” No momento do encerramento destas comemorações do Santo Condestável publicou-se (16) um texto com forte pendor patriótico e religioso elevando a figura do Condestável e as suas realizações “Por isso mereceu ser Herói, por isso pôde ser Santo.” ________________________________________________________________________ (1) O Pe. Renato Ziggiotti esteve em Portugal três vezes. A última, como Reitor Maior, aconteceu em novembro de 1961. O Pe. Armando Monteiro, Provincial dos Salesianos escreveu: “Considero a visita do Sr. P. Renato Ziggiotti como uma verdadeira graça do Céu que o nosso Santo Fundador nos concedeu.”( Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Dezembro, 1961, Ano XIX, N.º171). (2) O Pe. Guido Barra iniciou a visita no dia 31 de março e demorou-se na Província até fins do mês de maio de 1960. (3) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Janeiro, 1960, Ano XVIII, N.º 149. (4) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Janeiro, 1960, Ano XVIII, N.º149. (5) O Padrão dos Descobrimentos – 1960, Ministério das Obras Públicas, Comissão administrativa do plano de obras da Praça do Império. (6) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Fevereiro, 1960, Ano XVIII, N.º150. (7) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Janeiro, 1960, Ano XVIII, N.º151. (8) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Outubro, 1960, Ano XVIII, N.º157. (9) “Na Assembleia Nacional, sessão 194, foi dito e transcrito pela Secretaria da Assembleia: Página 385, REPÚBLICA PORTUGUESA, SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL, DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 194, ANO DE 1961 2 DE FEVEREIRO, ASSEMBLEIA NACIONAL, VII LEGISLATURA, SESSÃO N.º 194, EM 1 DE FEVEREIRO. (10) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Agosto/Setembro, 1961, Ano XIX, N.º167-168 (11) Engenheiro formado pelo Instituto Superior Técnico e licenciado em ciências Histórico-filosóficas da Universidade de Letras de Lisboa, foi figura destacada no seu tempo. Distinguiu-se como professor, poeta, orador, tendo como curiosidade o facto de ter sido o autor da letra do primevo hino do Sporting Club de Portugal, em 1956. (12) Boletim Salesiano, Órgão das Obras de D. Bosco, Agosto – Setembro, ano XIX, 1961. (13) Os Salesianos receberam esta presença em 1944. (14) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Maio, 1961, Ano XIX, N.º164. (15) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, Outubro, 1960, Ano XVIII, N.º157. (16) Boletim Salesiano – Órgão das Obras de D. Bosco, junho, 1961, Ano XIX, N.º165