“Não raiou ainda a paz perfeita, serena, duradoira”

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Lisboa – A rapaziada do Oratório Festivo das Oficinas de S. José - 1947

Terminada a 2.ª Guerra Mundial, em agosto de 1945, o mundo recompunha-se deste conflito de forma lenta e tentando sarar as muitas feridas abertas pela intransigência humana. Abordamos esta temática, uma vez mais, olhando as notícias, sob a realidade nacional, vinculadas no D. Bosco, do ano de 1947, então órgão dos Cooperadores Salesianos em Portugal.


Linhas convergentes

Por Frederico Pimenta

Releitura dos documentos originais da história dos Salesianos em Portugal. Trabalho ímpar de tantos investigadores, com especial destaque para o Pe. Amador Anjos, historiador, conhecedor profundo e inspirador de dissertações e teses sobre a vida e obra dos Salesianos em Portugal.

A Virtude da Fortaleza

Terminada a 2.ª Guerra Mundial, em agosto de 1945, o mundo recompunha-se deste conflito de forma lenta e tentando sarar as muitas feridas abertas pela intransigência humana. Abordamos esta temática, uma vez mais, olhando as notícias, sob a realidade nacional, vinculadas no D. Bosco, do ano de 1947, então órgão dos Cooperadores Salesianos em Portugal.

Sem ser lacónico, procuramos dar sucintamente os diversos episódios que marcaram esse ano e a sua respetiva contextualização ao meio envolvente.

No primeiro número do ano de 1947, (1) fevereiro/março/ abril, o Pe. Pedro RIcaldone, Reitor Maior dos Salesianos e IV sucessor de D. Bosco, delineou as linhas do anterior ano de 1946 e traçou horizontes de um futuro mais ledo, “Não raiou ainda a paz perfeita, serena, duradoira”. (2) No primeiro momento, testemunha: “É realmente notável o desenvolvimento dos nossos Institutos nos países não flagelados pela guerra”, em oposição aos atormentados pelas movimentações bélicas. Em breves linhas, compilou a situação vivida em diferentes espaços geográficos e o sacrifício, por alguém sentido, pela dedicação ao legado de D. Bosco. Relativamente ao que tocou a Portugal, realce para a referência à criação de várias escolas profissionais na ilha de Timor. Termina, afirmando: “Para nos mantermos preparados e serenos pratiquemos como programa durante o ano de 1947, A VIRTUDE DA FORTALEZA”.

Elucidativa carta chega através das páginas do D. Bosco, proveniente de Timor, mais concretamente de Díli, dando conta da situação que os missionários encontraram após o período da guerra: “Díli deu-me a impressão de ser o que realmente era há muitos meses: a cidade do silêncio, a cidade das ruínas, a cidade da morte!”. Estas palavras, escritas pelo punho do Pe. Manuel Alves Preto, traduzem, de forma explicita, o ambiente daquele lugar. Traduzem igualmente o sentir de duas figuras importantíssimas na esperada transformação então pretendida: D. Jaime Garcia Goulard, Bispo de Díli, e o Capitão Óscar Ruas, governador da colónia. E, claro está, a presença dos Salesianos.

As notícias referentes aos antigos alunos, neste número do D. Bosco, têm sede no Porto e no Estoril, dando nota do encontro com o grupo argentino de S. Lourenço de Almagro. Ainda na cidade invicta decorreu a Assembleia Geral para a eleição de nova Direção e a apresentação dos Gaiteiros do Porto formado por antigos alunos, “É formado por: viola, guitarra, ferrinhos e três realejos ou gaitas de boca. Este grupo toca, todas as quartas-feiras, no Posto Emissor Electro-Mecânico desta cidade, e foi a primeira vez que se apresentou no Salão da Oficina”.

Breve referência ao território de Goa e ao trabalho realizado pelos Salesianos e notícia da criação de um pequeno jornal, Oratório Salesiano D. Bosco, que mereceu escrito de D. José da Costa Nunes, Patriarca das Índias.

Sob o título Pelas nossas Casas, o número impresso testemunha a ordenação de dois novos padres salesianos: Mário Azzola e Américo Faria. Do Oratório Festivo do Porto, surge a redação de um texto sobre a importância dos oratórios. De Vila do Conde, concretamente da Escola Profissional de Santa Clara, a redação elucida sobre a criação da Escola Industrial e a inauguração do Oratório Festivo. Proveniente de Lisboa, do espaço físico das Oficinas de S. José, arrolam-se os acontecimentos em torno da festa de S. João Bosco com a Missa e “o afã dos competidores do Campeonato de Volei da M.P. Efectuou-se um encontro amigável de futebol entre o centro 19 da Escola de Marquês de Pombal e o Centro 58 Oficinas de S. José, que foi renhido, tendo a vitória bafejado os nossos por 3-0”.  Dando igualmente destaque à festa de S. João Bosco, da cidade de Évora, no espaço da Casa Pia, surge o relato da parte religiosa e a bênção de uma nova capela sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição e visita à oficina de encadernação. No complemento noticioso fica a indicação da participação dos alunos nas festas de Nossa Senhora das Candeias, na vila de Mourão.

A atividade das Filhas de Maria Auxiliadora, no Monte Caparica, no Asilo 28 de Maio, é igualmente abordada no momento festivo do dia de D. Bosco, através da descrição dos diversos momentos, com destaque para o da presença de Sua Alteza Real, a princesa de Itália acompanhada de Sua Alteza Real, D. Maria Gabriela.

O número inicial deste ano de 1947 conclui com a descrição das atividades do mês de janeiro, dos desportos e apostolado catequístico realizados na Escola e Oratório do Asilo de Santo António, no Estoril.

A segunda publicação de 1947 abrange os meses de maio/junho/julho. Sob o grande título Noticiário Salesiano – Pelas nossas Casas, a visão recai sobre Cabo Verde, Índia portuguesa, Évora e um documento fotográfico sobre a igreja paroquial de Mogofores confiada aos Salesianos. Em Cabo Verde, relata-se um percurso apostólico entre três aldeias da ilha de S. Nicolau: Praia Branca, Ribeira de Prata e Ribeira Brava. Relativamente ao território indiano sobressai a criação de três oratórios festivos, dois orfanatos, apresenta-se a perspetiva de edificação de escolas profissionais e a instituição de um seminário.

O título Évora – Progressos da Obra Salesiana, possui, subjacente, noticiário de relevante importância para a presença salesiana em Évora, elencando-se o desenvolvimento daquelas casas, “vimos empoleirado sobre um andaime o Director, rev. padre Filipe Pereira, a dar serventia, alçando baldes de cimento… No lado oposto, a reconhecida competência do rev. padre Morais dirigia a construção de uma escada”. São sinais da aplicação prática do sonho que levou os salesianos e as Filhas de Maria Auxiliadora à cidade alentejana, pois a redação dessas linhas noticiosas obedece ainda ao trabalho desenvolvido no Oratório de S. José, na Casa Pia e na Casa Pia Feminina.  A publicação D. Bosco reproduz estas imagens verbais extraídas da imprensa local, concretamente do jornal A Defesa de Évora.

A D. Bosco de agosto/setembro/outubro de 1947 regozija-se duplamente, quer pelos Salesianos, quer pelos Jesuítas, “Na empolgante apoteose de 22 de Junho ascenderam às honras dos altares, juntamente com o Beato José Cafasso, os Bem-aventurados Bernardino Realino e João de Brito”. 

O Pe. Hermenegildo Carrá subscreve um texto onde apresenta, destacando-se a riqueza desta informação, a estatística, nesse ano de 1947, das Casas de Formação do Pessoal Salesiano. No Seminário do Sagrado Coração de Jesus de Poiares da Régua, estiveram matriculados, no 1.º ano, 54 alunos e, no 2.º ano, 22 alunos; no Instituto Salesiano de S. João Bosco de Mogofores estiveram matriculados no 1.º ano 22 alunos, no 3.º ano, 22 alunos, no 4.º ano, 21 alunos e, na aprendizagem agrícola, 10 alunos; na Oficina de S. José do Porto estiveram matriculados 15 aspirantes na aprendizagem profissional; no Instituto Missionário Salesiano do Estoril, no Curso Filosófico, 19 alunos e, no Teológico, 21 alunos.  Na Inspetoria portuguesa, neste ano de 1947, “totalizam sete novos Padres Salesianos”. Entre os recém-ordenados, figura o nome de Amador Anjos Servo, que aludimos no início de cada texto. 

Na rubrica Pelas Nossas Casas desta edição do D. Bosco foca-se, numa primeira alínea, as diferentes atividades realizadas na casa do Estoril, com o dia das ordenações, elencadas no parágrafo anterior: a Festa da Mata, “Conta já treze anos de existência esta festa de caridade que de tal modo penetrou já na vida e ambiente estorilenses que bem pode ser considerada uma das mais tradicionais festas do lugar”; e o Centro dos Antigos Alunos. Numa segunda alínea, descrevem-se as atividades realizadas em Mogofores, a saber, a festa do Pe. José Maria Alves, no primeiro aniversário como diretor desta casa salesiana, e a aceitação da paróquia de Mogofores por parte dos salesianos. Na terceira alínea, proveniente de Poiares da Régua, surge, em forma de sumário, “Recordando um ano de vida salesiana”, o elenco mensal das atividades realizadas. Na quarta alínea, “Resumo de actividades do ano escolar de 1946-47”, referentes à Casa Pia de Évora, surgem notícias divididas por “Vida religiosa, Actividades da M. P. e Exames”; na mesma cidade, mas do Oratório de S. José, o “Encerramento do ano lectivo – Resultados obtidos – Visita ilustre”, esta última referente à visita do ex-rei de Itália a essas instalações e o desenvolvimento das obras de construção em curso. Na quinta alínea, um singelo texto descerra o elenco das atividades no Asilo 28 de Maio, orientado pelas Filhas de Maria Auxiliadora.  Na última e sexta alínea, referência a Lisboa, no espaço das Oficinas de S. José, e a concretização da festa dos finalistas, no dia 22 de maio desse ano de 1947, e “Não podemos deixar de fazer referência também ao «Album» dos finalistas, novidade no meio dos nossos colégios”.


  1. Todas as transcrições inclusas neste texto respeitam as normas de ortografia em vigor aquando da sua redação primitiva.
  2. Todas as transcrições foram retiradas dos três números publicados no ano de 1947, respetivamente fevereiro/ março/abril; maio/junho/julho e agosto/setembro/outubro.