“Seja em Português ou em Literatura Portuguesa, o importante é dar a palavra a quem as quer usar para se exprimir. Que as palavras dos nossos alunos voem e deem fruto (ou trigo!), num mundo em que muitos estão esquecidos do seu valor.”
A Palavra é a base da linguagem, portanto, a base da comunicação, da interação, do entendimento. Não haveria sociedades, instituições, cultura, nada, sem a palavra. Tudo foi construído por ela e por ela se construiu. Quero dizer, pela Palavra e pelas frases que ela permitiu montar, pelos discursos que se fizeram com elas e pelas ideias que brotaram dessas oralidades.
Vê-se claramente, então, que a Palavra é um veículo e um motor imparáveis, movendo mentes humanas, assaltando corações e alarmando as mais pacíficas almas. É a derradeira verdade: a Palavra fez o Homem, que só se fez Homem depois da Palavra. É legítimo, contanto, afirmar que não se apagaram, no entretanto do passar das eras, os fogos da retórica e da língua. A Palavra ainda é, como sempre foi, constante e inquebrável, a mais poderosa arma disponível ao ser humano.
Parece-me que há dois grandes territórios sob domínio da Majestade da Palavra. Deles, o primeiro é a acessibilidade, ou seja, a conveniente possessão do dom da comunicação por parte de toda e qualquer pessoa. Não é como se a capacidade de se expressar verbalmente, e até por escrito, fosse uma raridade. Cada vez mais se consegue munir o comum mortal, independentemente das suas particularidades, do gládio sagrado da alfabetização e da expressão oral. Grande parte dos sucessos da Palavra deve-se, de facto, à sua oportuna disponibilidade, ali, à mão de qualquer filósofo de ocasião, que, pregando as suas doutrinas, é capaz de obrar as maiores transformações nas consciências humanas, plantando a mudança na História. Todas as grandes revoluções sociais e antrópicas se iniciaram graças à Palavra e ao uso que lhe deram os mais variados caracteres, revestindo-se dela. De entre tantos, pode-se enumerar oradores e reformadores desde Jesus Cristo, simples nazareno sem instrução, decerto inspirado, contudo, a Marx e Engels, cujos pensamentos e obras publicadas fundiram a génese das lutas nos séculos vindouros.
Surge, segundamente, a capacidade inspiradora do discurso, a magia da oração. Nunca foi próprio da natureza humana a indiferença ao que é escutado. Quem teve a arte e o engenho suficientes e floreou os seus sermões, enchendo-os de uma alma apelativa, como uma mártir, que inchou as gentes de piedade e força de imitar, sempre triunfou em alevantar os ânimos e, em certos casos, revoltá-los. A estonteante retórica de determinadas personagens garantiu-lhes não só um precioso foco de protagonismo, como também a sempre essencial aprovação. Ou, porventura, não é do conhecimento geral que, não fossem as habilidades de púlpito de indivíduos como Adolf Hitler, nunca lhes teria sido possível alcançar os cargos e projetos a que se dedicavam. Um Hitler sem o dom da Palavra teria, com toda a certeza, sido incapaz de esconder por detrás de hábeis artifícios e promessas ressonantes as barbaridades e doutrinas inumanas de que se alimentava a sua alma perversa.
Como se pode pôr em causa o estatuto da Palavra quando se alicerça nas sólidas evidências que expus? Assim, como se pode duvidar que Ela permanecerá sempre, divina senhora dos corações dos Homens, exercendo neles os encantos de uma feiticeira? Claro que a Língua ainda possui o poder de mudar e decretar mentalidades, comandando o que é aceite e o que está condenado a arder na fogueira, odiado, sacrílego. Ao serviço de todos, pronta a cobrir-se dos mais coloridos véus e das mais pomposas joias, a Palavra é, na atualidade, o que era ontem. E será a mesma amanhã, inquestionável razão da evolução do Homem.
João Martins | 11 H1