“Se folgaram os livros, não faltaram em compensação, muitos divertimentos”

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Frederico Pimenta Linhas convergentes ________________________________________________________ Por Frederico Pimenta Releitura dos documentos originais da história dos Salesianos em Portugal. Trabalho ímpar de tantos investigadores, com especial destaque para o Pe. Amador Anjos, historiador, conhecedor profundo e inspirador de dissertações e teses sobre a vida e obra dos Salesianos em Portugal. 1943 – Notícias da família, numa Europa em guerra Situado em pleno coração da 2.ª Guerra Mundial, o ano de 1943 surge documentado na publicação dos Cooperadores Salesianos em Portugal de forma clara e elucidativa. Estudo semelhante fizemos para o ano de 1948, após a conclusão desta guerra terrível que grassou pela Europa. Igualmente, neste ensaio abordaremos, por enquanto, só o conjunto das vivências sentidas nas Oficinas de S. José de Lisboa, rejeitando momentaneamente as fruitivas descrições de outras casas salesianas. Impõe-se uma explicação ao leitor mais atento sobre a fonte utilizada neste levantamento do ano assinalado. A circulação do Boletim Salesiano , com o evoluir da 2.ª Guerra Mundial, tornou-se inexequível. A resposta surgida em Portugal afirmou-se pelo nome de Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal . Neste preciso ano, esta publicação celebrava vinte e um meses de existência e acrescia igualmente no assumir as características que identificavam o Boletim Salesiano mais tradicional. O diretor e editor desta nova publicação foi o Pe. José Maria Alves e este boletim foi composto e impresso nas Oficinas de S. José de Lisboa. O prólogo da edição datada de 24 de janeiro de 1943 abordou, “devidamente autorizados”, (1) a habitual carta enviada pelo reitor-mor, nesta data o Pe. Pedro Ricaldone, no início de cada ano. Destaque para a referência ao centenário da obra salesiana que decorreu em Turim e às dificuldades sentidas por virtude da guerra. Como uma carta que em tempos mais diosos se lia amiúde, o primeiro testemunho acerca das Oficinas de S. José de Lisboa surge com a descrição da festa de Natal do ano de 1942. Além da missa da meia-noite, realizou-se “a premiação aos alunos internos com os chamados presentes do Menino Jesus”, (2) realçada sempre com a indicação dos benfeitores que assistiam à instituição. No dia 27 de dezembro, os alunos que pertenciam ao “Grupo dramático D. João da Câmara” apresentaram uma encenação ao vasto público presente no salão de festa. Os prémios dos alunos externos foram distribuídos no dia 1 de janeiro de 1943 e, por último, a anotação da visita, no dia 4 de janeiro, de D. António M. Marcet, abade de Montserrat, Espanha. A narrativa derrama-se pelo mês de fevereiro, em que se descreve a festa de S. João Bosco, realizada em janeiro, “hoje uma das principais em todos os institutos da Congregação Salesiana”. (3) Da empolgante descrição destaca-se, na parte religiosa, o elogio ao “Grande Apóstolo da juventude” feito pelo Pe. João Roberto Marques; na parte recreativa, usou da palavra o Pe. Inspetor, Pe. Hermenegildo Carrá, que introduziu o Dr. Gaspar José Machado, professor do Liceu Normal de Lisboa, o qual deambulou acerca do sistema educativo de D. Bosco; as suas considerações surgiram, resumidas, com o devido destaque no número de março. As representações teatrais e os números de música encerraram os festejos. O Carnaval e, neste caso, os dias de Carnaval surgem expostos com a necessária “sã alegria”. (4) Momentos diferentes em que “Se folgaram os livros, não faltaram em compensação, muitos divertimentos”. (5) Narram-se representações de farsas e comédias, exposição do Santíssimo, refeição melhorada, jogos de carnaval e um “atraente espectáculo”. (6) Neste número de 24 de março de 1943 surge um destacado artigo do jornal A Voz sobre o momento da festa de S. José, no dia 19 desse mês. Elencou a presença do Pe. Hermenegildo Carrá, do Dr. Joaquim Dinis da Fonseca, subsecretário de Estado da Assistência Social, que declarou “a intenção do Estado Novo de continuar a ajudar as Casas de Beneficência”, (7) e a mesma intenção da Duquesa de Palmela que, cortando a fita, inaugurou “novas ampliações do edifício das Oficinas de S. José, onde se acham instaladas a sede dos ex-alunos desta casa, a aula de banda e a secção de encadernação”. (8) Relativamente à sede dos antigos alunos, ficamos a saber o nome de Luís da Cunha como seu presidente. Na publicação de 24 de abril de 1943 alude-se, no âmbito geral, ao enorme problema da guerra e, sobretudo, à ajuda necessária, pois os “Salesianos de todo o mundo resolveram intensificar, neste ano comemorativo das Bodas de Ouro do seu Superior Geral, a obra de assistência aos órfãos, aproveitando, até ao último ângulo, os Colégios antigos e abrindo as portas de mais de cinquenta novos orfanatos.” (9) No dia 29, chegou às Oficinas de S. José o Pe. Manuel José Preto, onde celebrou “as suas primeiras missas”, (10) após ordenação realizada na igreja Paroquial do Estoril, no dia 25 de março, na festa da Anunciação de Nossa Senhora pelo Arcebispo de Metilene. “No dia 28 realizou-se na Igreja Paroquial a Missa Nova do Sr. P. Manuel José A. Preto.” (11) Por último, damos nota do “Grupo Dramático D. João de Castro” que continuava os “vôos pindáricos” (12) e cuja apresentação mereceu destaque nos dias 22 e 23, no Ginásio . O Pe. Vítor Mangiarotti, da Oficina de S. José do Porto, orientou o retiro espiritual realizado nesse mês. Nos meses de maio e junho, o número publicado é conjunto. Evidencia-se a celebração, realizada no dia 27 de maio de 1943, em Turim, na Basílica de Nossa Senhora Auxiliadora, aquando do “quinquagésimo aniversário da Primeira Missa do Reverendíssimo Senhor Padre Pedro Ricaldone”. (13) Nesta comemoração esteve presente o Pe. Hermenegildo Carrá como vimos anteriormente, Inspetor dos Salesianos em Portugal. Esta participação foi noticiada na Dom Bosco , de onde ficamos a saber que a viagem foi realizada na companhia aérea “Ala Litoria” (14) no dia 20 de maio, e, além da presença nas cerimónias, representou ainda os Salesianos da Província portuguesa nas reuniões dos Inspetores salesianos da Europa. Como conclusão, formulam-se votos de que Deus “no-lo devolva são e salvo”. (15) A festa de Nossa Senhora Auxiliadora decorreu no dia 30 de maio e constou da celebração da missa e procissão no pátio do colégio, deambulações ginastas e momentos musicais. O número de julho apresenta-nos uma extensa redação acerca das cerimónias do Jubileu Sacerdotal do Pe. Pedro Ricaldone, em Turim, e inclui pormenores sobre os momentos vividos debaixo do período da guerra. No dia 29 de junho, realizou-se a festa do diretor das Oficinas de S. José, Pe. Paulo Colussi, a qual “decorreu em grande intimidade de família”. (16) O programa constou de missa solene, bênção do SS. Sacramento e sessão solene com representações teatrais. Ainda neste canto cronológico se dá conta da realização de um passeio “grande ou geral como aqui lhe chamam” (17) e das dificuldades sentidas habitualmente com o flagelo da guerra. O passeio decorreu na vila de Sintra, onde, no princípio da tarde, foi servido um jantar “à fresca sombra da frondosa mata da Sra. Duquesa de Palmela”. (18) Admirou-se a natureza e teceram-se considerações históricas: “Que fortes e arrojados eram os portugueses de antanho para conquistarem aos mouros estas culminâncias!” (19) As companhias religiosas realizaram igualmente os seus passeios: Companhia de S. Luís e do SS. Sacramento a Carnaxide e a Companhia de S. José à Amadora. E, em resposta ao voto formulado na partida, chegou o Pe. Hermenegildo Carrá da sua viagem a Turim. O número de agosto conduz-nos ao ambiente das férias. O último dia do ano letivo de 1942-1943 deu-se no dia 25 de julho. O dia começou com a Eucaristia, seguindo-se uma sessão solene no salão de festas, com a presença de altas individualidades. Presidiu o Pe. Hermenegildo Carrá, Inspetor, o qual distribuiu os diplomas de operário, que foram considerados de valor oficial, e o distintivo de antigo aluno. “De todos os prémios cumpre-nos salientar o «Oliveira Martins» (…) e os três prémios em dinheiro oferecidos pelo Sindicato dos Gráficos…”. (20) Um novo número conjunto, setembro e outubro, não introduziu qualquer tema relacionado com as casas em Portugal, no espaço europeu e, em especial, nas Oficinas de S. José. Os relatos contidos na publicação de novembro contam-nos os momentos de regresso ao espaço das Oficinas de S. José após as férias: “Os já antigos entraram no dia 4 e os novos no dia 6.” (21) Estávamos então no mês de outubro de 1943. No dia 7, “o sólido tríduo de introdução ao novo ano lectivo.” (22) foi orientado pelo Pe. Valentim. No dia 10, realizou-se a “(…) festa do regulamento (…)” (23) e o aluno Fernando Tomás “(…) prometeu aos superiores, em nome de todos os companheiros, fidelidade ao caminho que lhes era traçado.” (24) As atividades iniciaram-se efetivamente no dia 11 com a abertura das “(…) aulas primárias, a Escola Comercial e a Escola Industrial.” (25) Dia 17 ficou marcado por um encontro de “ex-alunos” que elegeu a nova presidência e tratou da organização de vários temas, em especial o da biblioteca para esses membros. O último mês do ano de 1943 (26) trouxe à estampa várias notícias que mostram o contexto da casa salesiana de Lisboa no espírito da sociedade de então. O “Grupo dramático D. João da Câmara”, referenciados nas linhas supra, realizou no dia 28 de novembro um espetáculo dedicado ao antigo aluno da Oficinas de S. José, Igrejas Caeiro, (27) nas instalações das Oficinas de S. José. O dia 1 de dezembro, numa movimentação da Mocidade Portuguesa, saudou o acontecimento histórico agregado a esta data e no dia da festa da Imaculada Conceição, com preparação orientada pelo Pe. Francisco Pippan, do Asilo de Santo António do Estoril, celebrou-se a padroeira com a Eucaristia e Comunhões orientadas pelo Pe. Paulo Calussi, diretor das Oficinas de S. José, e com a atuação de grupo coral e encenações. Terminamos, como no primórdio deste ensaio, inclusos no espírito natalício das Oficinas de S. José de Lisboa: “Os superiores e alunos dos colégios de Portugal, (…) vêm desejar-lhes, nesta quadra risonha do Santo Natal, BOAS FESTAS e um ANO NOVO muito feliz e próspero.” (28) __________________________________________________________________________ (1) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, 24 de Janeiro de 1943, N.º 21. (2) Ibidem . (3) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, 24 de Fevereiro de 1943, N.º 22. (4) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, 24 de Março de 1943, N.º 23. (5) Ibidem. (6) Ibid . (7) Ibid . (8) Ibid . (9) D om Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, 24 de Abril de 1943, N.º 24. (10) Ibidem . (11) Ibid . (12) Ibid . (13) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Maio – Junho de 1943, N.º 25 e 26. (14) Ibidem . A companhia de aviação italiana Ala Littoria operou durante as décadas de 1930 e 1940. Encerrou as atividades em 1946. (15) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Maio – Junho de 1943, N.º 25 e 26. (16) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Julho de 1943, N.º 27. (17) Ibidem . (18) Ibid . (19) Ibid . (20) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Agosto de 1943, N.º 28. (21) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Novembro de 1943, N.º 31. (22) Ibidem . (23) Ibid . (24) Ibid . (25) Ibid . (26) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Dezembro de 1943, N.º 32. (27) Nasceu em 1917 e estreou-se como ator em 1940. Foi ator, locutor de rádio, televisão e político. Faleceu no ano de 2012. (28) Dom Bosco, órgão dos cooperadores salesianos em Portugal , Ano II, Lisboa, Dezembro de 1943, N.º 32.