Bons alunos numa turma, maus alunos para outra turma, a chave do sucesso. Será?
Como na altura referi no Atenta Inquietude em 2015/2016 iniciou-se em duas escolas Madeira uma experiência de constituição de turmas por nível de desempenho, bons e maus alunos. A medida foi alvo de alguma polémica como seria previsível.
Ontem o Público divulgava que nestes três anos a Escola Básica dos 2.º e 3º ciclos do Caniço diminuiu a retenção de 20,8% para 4% e a Escola Básica 2,3 de Estreito de Câmara de Lobos baixou de 11% para 3.1%.
A conclusão que aparentemente se retira é que juntar alunos maus numas turmas e alunos bons noutras turmas é bom para todos. Aliás, o título da peça do Público é ilustrativo, “Separar alunos para melhorar os resultados? Nestas escolas resulta”. Será?
Não, não me parece.
Segundo o Director da EB 2/3 do Estreito de Câmara de Lobos, “as turmas de recuperação (as dos maus alunos) sempre tiveram mais meios pedagógicos do que as restantes”.
Também afirmou que as turmas tinham um máximo de 16 alunos e que as turmas contavam com dois professores por disciplina.
Em 2016, numa fase intermédia do projecto, já com resultados positivos e que também comentei no blogue se afirmava que os alunos com mais dificuldades tiveram “mais apoio pedagógico”, as turmas têm um número de alunos razoável, um máximo de 15 e em Português, Matemática e Inglês ou Língua Estrangeira a presença de dois professores em simultâneo na sala.
Parece-me claro que o sucesso do trabalho de alunos e professores, que registo e me deixa satisfeito, não decorrerá da homogeneidade das turmas, algo que evidentemente não existe pois não se conhecem dois alunos iguais.
Na verdade se a homogeneidade fosse uma ferramenta de sucesso, todas as turmas que existem em muitas escolas constituídas por alunos “descamisados”, maus alunos, repetentes, mal comportados, desmotivados, etc., teriam de imediato sucesso, seriam homogéneas.
A verdade é que não têm. Esta medida já existiu em tempos com as turmas de nível e quem conhece a realidade sabe que os resultados dos alunos “maus” continuaram, genericamente maus, o povo diz junta-te aos bons e serás como eles, junta-te aos maus e serás pior do que eles.
O que fomenta o sucesso é “mais apoio pedagógico” aos alunos com mais dificuldades.
O que fomenta o sucesso é um “número de alunos por turma razoável” e que permite um melhor trabalho e mais atenção individual como os estudos mostram e levaram o ME ao abaixamento do número de alunos por turma.
O que fomenta o sucesso é o recurso a dispositivos como o “par pedagógico”, dois professores em simultâneo nas disciplinas em que os alunos experimentam mais dificuldades.
Generalizem medidas desta natureza e teremos melhor trabalho de alunos e professores.
Não é sustentável afirmar que a variável que contribuiu para os bons resultados atingidos é a homogeneidade das turmas. É ainda perigoso que esta leitura possa legitimar decisões na constituição das turmas, guetizando alunos sem resultados se as outras variáveis não forem consideradas. Como muitas vezes não são.
Quanto ao impacto, parece óbvio que a diversidade é sempre preferível a uma falsa homogeneidade. As atitudes de discriminação negativa não apresentam nenhuma espécie de vantagem pessoal ou social, guetizam, estigmatizam e promovem quer nos bons, quer nos maus, uma relação desconfiada e tensa facilitadora de problemas.
As dificuldades escolares gerem-se com apoios e recursos que terão certamente de ser diferenciados mas não podem, não devem, implicar a criação de “guetos” para os “maus” ou de “condomínios” para os “bons”.
José Morgado