| Um Pomar, uma Orquestra |

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| Um Pomar, uma Orquestra |Visto de cima os pomares têm árvores todas iguais. Na terra da minha avó temos duas figueiras. Uma dá-nos frutos bem cedo no Verão. Não são doces, nem grandes e vistosos… A outra atrasa-se muito e oferece figos suculentos no fim da época. Quando chegamos parecem ao longe que são iguais. Mas não são. 
 
– “Passa Inês, passa” ou – “Chuta lá Tomás”. 
 
É assim que encerramos os trabalhos da Orquestra do Musicentro. Em vez de notas, corridas, saltos, cestos, golos, sumos, bolos e bolas, croquetes, sorrisos. Imensas gargalhadas e com espaço para as memórias dos vários concertos realizados.
 
Quando se semeia não conseguimos em todos os momentos ser perfeitos. E mesmo que o sejamos nunca saberemos o que iremos colher.
 
O som de uma orquestra depende de muitas coisas. Tal como no campo uma árvore ou planta depende de muita coisa para crescer. Da labora no cultivo (professores/acompanhadores no crescimento como gosto de dizer), da terra (especificidades da escola de música), do tempo (dos altos e baixos de todos os intervenientes, e das próprias árvores e plantas que também lutam por crescer (os alunos). Há terras, poucas, em que qualquer semente atirada cresce, gera árvore, flores e fruto.

A orquestra do Musicentro tem a “sua terra” com especificidades. Estamos atentos. Tem “acompanhadores e passadores de experiências” dedicados. Tem alunos que também lutam para crescerem em várias áreas. Não só na música. E por isso temos de ter um pouco de paciência, perceber a especificidade porque às vezes “jogam” ainda em vários palcos. Estamos atentos. O som da Orquestra do Musicentro também depende dos dias pois todos temos dias menos bons. Somos compreensivos e exigentes quando o dia é bom.
 
O som da orquestra do Musicentro está a tornar-se mais doce, mais forte, mais intenso, está a crescer. Com mais sumo. E aqui todas as árvores são bem-vindas.
 
Daqui a algumas semanas retornarei à aldeia de meus avós que se tornou a minha aldeia. À minha espera as silhuetas da grande e doce figueira e a outra, grande, mas estranhamente precoce nos frutos, mas menos doce…. Tenho assim a sorte de ter figos em junho/julho e no fim do Verão. E pensar que um dia considerámos cortar a menos doce…  Há pessoas capazes disso. Há escolas capazes disso. Nós não.  

Rui Gonçalves | Professor e Maestro da Orquestra do Musicentro